domingo, 30 de dezembro de 2012

Por que os Estados Unidos fracassaram

Morris Berman, 67 anos, é um acadêmico americano que vale a pena conhecer.
Acabo de ler “Por Que os Estados Unidos Fracassaram”, dele. A primeira coisa que me ocorre é: tomara que alguma editora brasileira se interesse por este pequeno – 196 páginas — grande livro.

A questão do título é respondida amplamente. Você fecha o livro com uma compreensão clara sobre o que levou os americanos a um declínio tão dramático.

O argumento inicial de Berman diz tudo. Uma sociedade em que os fundamentos são a busca de status e a aquisição de objetos não pode funcionar.

Berman cita um episódio que viu na televisão. Uma mulher desabou com o rosto no chão em um hospital em Nova York. Ela ficou tal como caiu por uma hora inteira, sob indiferença geral, até que finalmente alguém se movimentou. A mulher já estava morta.

“O psicoterapeuta Douglas LaBier, de Washington, tem um nome para esse tipo de comportamento, que ele afirma ser comuníssimo nos Estados Unidos: síndrome da falta de solidariedade”, diz Berman. “Basicamente, é um termo elegante para designar quem não dá a mínima para ninguém senão para si próprio. LaBier sustenta que solidariedade é uma emoção natural, mas logo cedo perdida pelos americanos porque nossa sociedade dá foco nas coisas materiais e evita reflexão interior.”

Uma sociedade movida pela busca de status é insustentável
Berman afirma que você sente no ar um “autismo hostil” nas relações entre as pessoas nos Estados Unidos. “Isso se manifesta numa espécie de ausência de alma, algo de que a capital Washington é um exemplo perfeito. Se você quer ter um amigo na cidade, como Harry Truman disse, então compre um cachorro.”

O americano médio, diz ele, acredita no “mito” da mobilidade social. Berman nota que as estatísticas mostram que a imensa maioria das pessoas nos Estados Unidos morrem na classe em que nasceram. Ainda assim, elas acham que um dia vão ser Bill Gates. Têm essa “alucinação”, em vez de achar um absurdo que alguém possa ter mais de 60 bilhões de dólares, como Bill Gates.

“Estamos assistindo ao suicídio de uma nação”, diz Berman. “Um país cujo propósito é encorajar seus cidadãos a acumular mercadorias no maior volume possível, ou exportar ‘democracia’ à base de bombas, é um navio prestes a afundar. Nossa política externa gerou o 11 de Setembro, obra de pessoas que detestavam o que os Estados Unidos estavam fazendo com os países delas. A nossa política (econômica) interna criou a crise mundial de 2008.”

A soberba americana é sublinhada por Berman  em várias situações. Ele cita, por exemplo, uma declaração de George W Bush de 1988: “Nunca peço desculpas por algo que os Estados Unidos tenham feito. Não me importam os fatos.” Essa fala foi feita pouco depois que um navio de guerra americano derrubou por alegado engano um avião iraniano com 290 pessoas a bordo, 66 delas crianças. Não houve sobreviventes.

Berman evoca também a Guerra do Vietnã. “Como entender que, depois de termos matado 3 milhões de camponeses vietnamitas e torturado dezenas de milhares, o povo americano ficasse mais incomodado com os protestos antiguerra do que com aquilo que nosso exército estava fazendo? É uma ironia que, depois de tudo, os reais selvagens sejamos – nós.”

Você pode perguntar: como alguém que tem uma visão tão crítica – e tão justificada – de seu país pode viver nele?

A resposta é que Berman desistiu dos Estados Unidos. Ele vive hoje no México, que segundo ele é visceralmente diferente do paraíso do narcotráfico pintado pela mídia americana — pela qual ele não tem a menor admiração. “Mudei para o México porque acreditava que ainda encontraria lá elementos de uma cultura tradicional, e acertei”, diz ele. “Só lamento não ter feito isso há vinte anos. Há uma decência humana no México que não existe nos Estados Unidos.”

Paulo Nogueira

As neofavelas americanas

A concentração de renda nos Estados Unidos está criando ajuntamentos precários à base de barracas
Tent Cities. Cidades de barracas. 

A versão americana das nossas favelas. Elas estão se espalhando assustadoramente pelos Estados Unidos. Já estão presentes em pelo menos 55 cidades do país.

Elas representam o extremo grau de desigualdade social a que chegaram os Estados Unidos. 47 milhões de americanos estão vivendo abaixo da linha da pobreza. Isso é equivalente a cerca de 15% da população. (Na métrica americana, essa linha está na faixa de 1 000 dólares por mês.)


O que aconteceu com o sonho americano?

Foi usurpado por uma rarefeita, predadora, gananciosa elite mandante que, entre outras coisas, diminuiu absurdamente a carga de impostos dos ricos nas últimas décadas. Só recentemente esse descalabro veio à tona — quando o bilionário Warren Buffett mostrou, num artigo que entrou automaticamente para a história americana, que paga proporcionalmente menos imposto que sua secretária.

Os ricos americanos gostam de se gabar de sua filantropia, de suas ações de caridade. É uma falácia. Rico tem que pagar impostos. Ponto. É o que acontece na sociedade escandinava, a mais avançada do mundo — a única em que genuinamente se formou um consenso segundo o qual impostos altos para quem tem mais dinheiro são o preço a pagar para o bem estar geral da população. Não adianta você dar x em ações filantrópicas se manobra nos bastidores para que as leis permitam a você economizar 2x em impostos.

Os moradores das neofavelas americanas estão enfrentando temperaturas sinistras – e, não bastasse isso, a iniquidade das pessoas que de fato mandam em Washington. Para a maior parte deles não existe água corrente e nem luz elétrica — e nem comida suficiente. (Você pode ler uma boa reportagem de hoje da BBC sobre o tema. Fora isso, um vídeo de uma emissora americana com imagens e depoimentos expressivos. Assista ao vídeo.)

É lamentável que os Estados Unidos tenham se convertido na negação das virtudes pregadas por líderes como George Washington e Thomas Jefferson, como frugalidade e solidariedade. Ao seguir a receita dos fundadores da nação, os Estados Unidos se transformaram no que foram. Ao dar brutalmente as costas para ela, viraram o que são – um pesadelo, povoado por barracas de miseráveis que se multiplicam.

Diário do Centro do Mundo


Assista aos vídeos abaixo:

Poverty in America Land of the Free, Home of the Broke

The new homeless

Educação é 'prioridade absoluta', diz Dilma. - Tá de sacanagem, né?!?

Comentário: bom, ela já sabe o que precisa ser feito, mas não está fazendo, do que adianta ficar só no discurso??? É hipocrisia, farsa ou pura maldade!!! Se não vai fazer o que é preciso, pelo menos nos poupe do discurso vazio e falacioso.


Na entrevista coletiva de quinta-feira, a presidente Dilma Rousseff reafirmou que a educação é uma “prioridade absoluta” de seu governo. O assunto tem sido tema frequente de seus discursos e, segundo ela, dá sentido a outras medidas tomadas pelo governo, inclusive as econômicas.


“O Brasil não terá crescimento sustentável se não investir em educação, e muito. Da creche à pós-graduação”, disse a presidenta, durante café da manhã com jornalistas. “Se não colocarmos dinheiro em educação, não tem saída.” 

Segundo Dilma, a educação é o único fator que pode unir “os dois mundos” que existem no Brasil: o da extrema pobreza e o a da ciência, tecnologia e inovação. “É a educação que une esses dois mundos. Para os adultos, o emprego tira da pobreza, mas criança só sai da pobreza com educação”, comparou. “Não tem ciência e tecnologia num país que não tem massa crítica”, acrescentou.

A presidenta defendeu programas de alfabetização na idade certa e escolas em tempo integral. “Mas não só com esporte e artes. Escola integral com mais português, com mais matemática, com língua estrangeira”, listou.
Olha o tipo de prioridade que ela está dando para a educação.
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG TRIBUNA – Notem que os repórteres escreveram REAFIRMOU, ao invés de AFIRMOU. Ou seja, registraram que não é novidade, porque a presidente Dilma costuma afirmar que educação é prioridade absoluta. Suas palavras comprovam a constatação de que já não se faz mais jornalista como antigamente. Nenhum dos repórteres presentes (eram mais de 20) estranhou a declaração e perguntou que prioridade é essa. No Brasil das últimas décadas, educação nunca foi prioridade de governo, quanto mais prioridade absoluta. Esta presidente é uma farsante.

Tribuna

Chargista brasileiro responde ao ranking dos "10 maiores antissemitas" do mundo

O colaborador Carlos Latuff está em lista da organização Simon Wiesenthal pelas críticas feitas ao governo israelense.

O cartunista brasileiro e colaborador do Opera Mundi Carlos Latuff respondeu também por meio de uma charge ao ranking dos “10 maiores antissemitas” ao redor do mundo feito pela organização Simon Wiesenthal e divulgado nesta quinta-feira (27/12). Latuff aparece na terceira posição na lista de 2012 por conta de suas charges críticas à operação Pilar Defensivo, mais recente investida militar israelense na Faixa de Gaza.

Conhecido internacionalmente por suas charges, o artista se aproximou da luta palestina no final dos anos 1990, quando viajou ao país e, desde então, imprime críticas à política israelense. No ranking, Latuff aparece depois da Irmandade Muçulmana do Egito e do líder iraniano Mahmoud Ahmadinejad, e à frente de torcidas organizadas e partidos políticos neonazistas.


Ele criticou a lista feita pela organização. "Crítica ou mesmo ataque a entidade política chamada Israel não é ódio aos judeus porque o governo israelense não representa o povo judeu, assim como nenhum governo representa a totalidade de seu povo”, escreveu.

Opera Mundi

Caso Latuff: A inversão ideológica; como fazer do ocupante uma vítima



Um breve resgate histórico sobre a formação do Oriente Médio, nos permite constatar que a fundação do Estado de Israel esta intimamente relacionado à muitos conflitos regionais. Porém desde a internacionalização do conflito Israel – Palestina decorrente da emergência do problema dos refugiados palestinos em 1948, o assunto passou a ser amplamente discutido nos meios jornalísticos, artísticos e acadêmicos no mundo inteiro. 

A partir de então, entre tantos adversários da política israelense, muitos antissemitas confessos também passaram a configurar nessa mesma lista. Motivo pelo qual existem hoje a assimilação de toda crítica à Israel e de sua política à uma nova versão do antissemitismo. Mesmo sentimento pelo qual acarretou na ira de muitos deputados do Knesset (parlamento israelense), no momento em que o líder Yasser Arafat, à convite oficial do governo norte-americano, visitou o museu do Holocausto em Washington, em 1998. Cabe indagar, no entanto, o que teria acontecido se ele recusasse o convite? 

Analisar a atual amplitude do termo antissemitismo requer antes de mais nada, eliminar qualquer confusão entre judaísmo e política israelense, distinguir entre crítica política e antissionismo e, sobretudo diferenciar antissemitismo e antissionismo. Essa confusão conceitual, propositadamente utilizada, teve início, muito provavelmente antes da segunda Intifada, no momento em que Ariel Sharon, de maneira provocativa visitou a Esplanada das Mesquitas/Monte do Templo em Jerusalém sob um forte esquema de segurança, às vistas de cerca de centenas de palestinos que estavam naquele local, a presença do primeiro ministro acarretaram violentos confrontos e muitas mortes, naquela ocasião.

Desde então um grupo de intelectuais da comunidade judaica – sionista, tem se dedicado à explorar politicamente a possibilidade dos desvios antissemitas a fim de angariar apoio em direção à política pró- israelense.

Se os atos discriminatórios aos judeus são intoleráveis, não é indiferente constatar que atualmente esses casos estejam intimamente ligados aos conflitos no Oriente Médio. Por outro lado, a suspeita de que os verdadeiros antissemitas se apropriam da causa palestina, não é considerado praticamente ilegítima.

Diante de todos esses fatores, um grande temor emerge por parte daqueles que estão dispostos à fazer críticas contra o governo israelense, sob pena de serem alvo de difamação, por intermédio da acusação de cometerem atos antissemita. De acordo com essa ideologia então predominante, o sionismo passa a ser sinônimo de Israel, ou seja, deixa de ser um movimento político e se torna o próprio Estado.

Os estragos causados por essa deformação são enormes, atingem desde a questão do véu islâmico, vai de encontro ao demasiado apoio à visão dos neoconservadores norte-americanos, até à obsessão securitária. Ao mesmo tempo, esses porta-vozes da comunidade judaica-sionista banalizam o antissemitismo e difamam centenas de judeus que rejeitam publicamente todas essas manipulações. De fato, quando a acusação de antissemitismo é sistematicamente utilizada para defender Israel à qualquer preço, inviabiliza, da mesma forma para que a eficácia dessas acusações recaiam de fato, naqueles que depredam as sinagogas ao redor do mundo, em conformidade à bandeira neonazista.

O sentimento antissemita, para esses autores, podem ser encontrado em todos os lados, mas principalmente na esquerda politica, dentro das comunidades árabes e islâmicas e, entre os judeus de esquerda. Esse inconveniente, acarreta no atual processo de transformação de toda a comunidade árabe, em um grande alvo de perseguições, ocupado no passado pela figura do judeu, de acordo com as palavras de Edward Said, em sua obra Orientalismo – O Oriente como uma invenção do Ocidente.

O antigo enredo da conspiração, a qual revelava a figura do judeu como o promotor de um empreendimento mundial desapareceu. Em seu lugar, emerge a representação simétrica com relação aos árabes e muçulmanos, na imagem dos grandes detentores das riquezas petrolíferas e do terrorismo suicida internacional.

Essa mesma imagem também foi explorada pelo comediante brasileiro, Marcelo Adnet, em um dos programas Comédia MTV, a qual de maneira irresponsável apresentou em formato de humor o que seria uma seleção dos melhores vídeo clips no Mundo Árabe e Islâmico. Adnet personifica um apresentador afegão, em um cenário deserto, com cavernas e vestido com uma roupa típica dos talebans e explora demasiadamente muitos esteriótipos árabes e islâmicos.

Um dos esteriótipos mais marcantes é a questão do ódio e da intolerância irracional nata por parte de todos os muçulmanos ao ocidente, simbolizada na referência irônica do apresentador ao sequestro dos jornalistas europeus no Afeganistão e no obsessivo projeto de destruição da cultura ocidental e norte-americana no mundo. Sobre esse aspecto, o muçulmano, representado por Adnet é apresentado como um sujeito ignorante, preconceituoso e violento, em um dos vídeos clipes apresentados, a sua esposa (encenada por um ator) usa uma burca preta, semelhante às utilizadas pelas mulheres na Arábia Saudita. 

A violência contra a mulher muçulmana é apresentada de forma espontânea e generalizada, sobretudo quando o marido dela (no vídeo clipe) a ameaça com violência, diante da possibilidade de adultério. No mesmo instante em que a música estava sendo cantada pelo humorista, outro ator da mesma emissora realiza uma coreografia ao fundo, com um figurino jihadista e muitos explosivos ao redor do seu corpo, numa imagem que remete ao incurável fanatismo islâmico.

Além da prática de islamofobia (termo que denota aversão ao islã), o mesmo programa, de maneira debochada, apresentou em um dos “vídeos clipes premiados”, um palestino na Cisjordânia ocupada, representado por um funkeiro armado com duas metralhadoras, cuja a música retrata a banalização da violência contra os seus inimigos. A distorção das imagens utilizadas pelo programa juvenil e pelo humorista retrata o palestino de modo a ressaltar uma série de esteriótipos que vão muito além dos preceitos islamofóbicos. O palestino, o “Mc Mata” canta o funk É nois que tá, sob um refrão “Cisjordânia é nóis que tá”. 

Ainda diante das graves conseqüências do emprego à islamofobia, muito recentemente, o embaixador norte-americano na Líbia, J. Christopher Stevens e três colegas de trabalho foram mortos na cidade de Benghazi, em um ataque de manifestantes salafistas (em sua maioria) ao escritório do consulado americano na cidade. O trágico ataque teria sido motivado por uma grande revolta gerada pelas informações contidas no filme Innocence of Muslims, produzido pelo americano-israelense Sam Bacile, as quais retratam o profeta Mohammed de modo caricato.

O auge da revolta no entanto, ocorreu após uma entrevista do diretor do filme ao Wall Street Journal, a qual declarou publicamente “que o Islã é um câncer”. O que de fato culminou para que as revoltas se espalhassem para outros países de maioria muçulmana, como o Egito. No Cairo, enquanto cerca de milhares de manifestantes protestavam em frente à embaixada dos Estados Unidos, alguns representantes da Fraternidade Muçulmana muito oportunamente puderam convocar novos protestos pacíficos contra o filme para a sexta-feira seguinte (dia sagrado na religião muçulmana).

A repercussão negativa da produção cinematográfica, ecoou, da mesma forma, dentro do grupo Taliban (no Afeganistão). Na quarta-feira (dia 12 de setembro), líderes talibans pediram à comunidade afegã para que se preparem para uma “guerra” contra os americanos e apelaram para que insurgentes “se vinguem” nos soldados norte-americanos ainda presentes no país.

Por esse lado, e afim de evitar tanta violência decorrente de distorções conceituais, todas as questões relativas ao sionismo, antissionismo, antissemitismo e islamofobia, deveriam ser formuladas no espaço público, de modo eqüitativo, de preferência dentro das Universidades, de acordo com o comprometimento dessas instituições na promoção ao debate político e acadêmico. Porém, muito diferentemente do papel que deveriam exercer, as Universidades, cada vez mais, têm sido palco de uma campanha de censura de informações e de difamação, capazes de distorcer qualquer trabalho artístico e acadêmico pró-palestino sob a acusação de práticas de antissemitismo. 

Um dos principais alvos de difamação no Brasil, o cartunista Carlos Latuff, em algumas ocasiões teve o seu nome registrado em citações jornalistas e acadêmicas como um exemplo de artista antissemita, desde que começou a posicionar-se politicamente por meio de suas criações sobre a questão palestina, ao transmitir em seus desenhos à realidade dos territórios ocupados, a discriminação, a política de expansão dos assentamentos, o muro e muitos outros casos de desrespeito aos direitos humanos. Toda a campanha de difamação pessoal, atingiu o seu auge, sobretudo no momento em que participou de um concurso de cartoons sobre o Holocausto em Teerã (muito condenado internacionalmente). Cabe ressaltar que o evento iraniano foi criado em resposta à divulgação de alguns cartoons dinamarqueses sobre a imagem do profeta Mohammed, líder religioso da religião muçulmana.
Nessa altura, ao classificar-se em segundo lugar com um trabalho que retratava um palestino chorando diante de um muro erguido pelo governo de Israel, toda a polêmica do desenho, girou em torno do detalhe da roupa do palestino: um uniforme de prisioneiros dos campos de concentração nazista. A inevitável comparação do nazismo à política israelense nos territórios ocupados palestinos, rotulou à partir daí, todos os trabalhos do cartunista como sendo de natureza tendenciosa, antissemita e não comprometida com a promoção da paz. 

Por outro lado, são ainda poucos o que conseguem de fato diferenciar os trabalhos preconceituosos dos trabalhos sérios, comprometidos com questões políticas e sociais relevantes. Ao tratarmos sobre os nomes citados, Marcelo Adnet, Sam Bacile e Carlos Latuff respectivamente, é bem possível constatar o uso apelativo dos dois primeiros aos estereótipos de modo à prejudicar a imagem da comunidade árabe, da mulher muçulmana, do anseios do povo palestino e da religião. Muito diferente dos desenhos de Carlos Latuff que, muito embora retratem de maneira crítica alguns integrantes do governo de Israel e de seu Exército, nunca o fazem de forma pejorativa e estereotipada, como eram feitos no passado, pelos publicitários do Reich alemão. Foi durante essa época que os judeus, de uma maneira geral, costumavam serem retratados na imagem do banqueiro explorador e mercenário, na figura do comunista perigoso e violento e suas feições geralmente ressaltavam o nariz e uma cartola mais extravagante do que o normal. 

Aqui no Brasil, mesmo diante da gravidade das imagens retratadas nos programas humorísticos apresentados por Marcelo Adnet transmitido pelo canal MTV, o seu nome nunca esteve envolvido em quaisquer acusações de prática de discriminação de teor islamofóbico, qualificado como uma forma de racismo, de acordo com as palavras do secretario das Nações Unidos, Ban Ki-Moon, durante discurso proferido em uma Conferência Internacional contra o Racismo, em Genebra (Suiça). Muito diferente, dos prestigiados trabalhos do Latuff, que frequentemente são alvos de acusações por práticas de antissemitismo, sem qualquer tipo de critério.

A manipulação do conceito de antissemitismo comporta, nesse sentido, muitas armadilhas intelectuais e morais. Criticar Israel não significa negar o direito ao Estado, o direito à crítica é vital para todas as sociedades democráticas e, as sociedades que protegem esse direito têm mais chances de sobreviver do que as que negam. 

Luciana Garcia de Oliveira  -  Integrante do Grupo de Trabalho sobre o Oriente Médio e o Mundo Muçulmano do Laboratório de Estudos sobre a Ásia da Universidade de São Paulo (LEA-USP).

Carta Maior

sábado, 29 de dezembro de 2012

Natal no Santander: demissões em massa



Banco espanhol não respeita o Brasil e os brasileiros

Às vésperas do Natal, o Banco Santander demitiu mais de mil bancários, pais e mães de família, muitos deles próximos da aposentadoria. Não há razão econômica para esse ataque desumano contra os trabalhadores brasileiros. O Santander é um dos cinco maiores bancos que operam no Brasil. 

De janeiro a setembro deste ano, teve lucro líquido de quase R$ 5 bilhões. Esse ganho gigantesco representa 26% do lucro mundial do banco espanhol. É o maior lucro que obteve em qualquer país do mundo, inclusive na Espanha. 

Mas é só no Brasil que o Santander demite. Nem na Espanha, que está numa crise profunda, há demissões. Por que o banco espanhol usa o Brasil para tirar sua maior fatia de lucros e deixa aqui milhares de mães e pais de família desempregados? 

Exigimos o fim das demissões e mais contratações. 

Os clientes também serão prejudicados, porque o atendimento vai piorar. Por isso pedimos a você que nos ajude nessa campanha. Exija do banco que respeite o Brasil e os brasileiros.

Reclame do Santander diretamente com o Banco Central. A ligação é gratuita, de qualquer parte do País, para o número 0800-979-2345. Também está disponível o número 0800-642-2345, de atendimento exclusivo ao surdo e deficiente auditivo e da fala. 

Cobre do Santander que reverta as demissões e contrate mais bancários, para acabar com as filas e melhorar o atendimento, bem como para exigir redução das taxas de juros e das tarifas, além de mais segurança.


Intersindical

Bicho de estimação faz bem à saúde!

Pesquisas comprovam que seus donos têm menos estresse, mais motivação para se exercitar, maior desenvolvimento da afetividade e melhora do sistema imunológico.
Poder de cura animal

Se você pensa em ter um animal de estimação e ainda está pesando os prós e contras da relação, saiba que, além de ser uma delícia, o contato com os bichanos domésticos traz benefícios à sua saúde. Diminuição do estresse, motivação para se exercitar, desenvolvimento da afetividade, sensação de prazer e melhora do sistema imunológico são alguns deles, afirma a psicóloga Luiza Cruz, diretora da Associação Brasileira de Qualidade de Vida.


Pesquisas recentes apontam, inclusive, que crianças autistas que convivem com um cachorro têm um melhor desenvolvimento e interação com o mundo. De acordo com os especialistas do Centro de Pesquisa do Hospital de Brest, na França, que realizaram estudo envolvendo 260 pacientes, os melhores resultados foram encontrados em pessoas que passaram a ter cachorro aos 5 anos de idade, seguido do subgrupo que sempre conviveu com eles.

Para a psicóloga Giovana Del Prete, vice-diretora da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental, crianças e idosos são os mais beneficiados pelo convívio com gatos, cachorros, pássaros, coelhos, tartarugas ou seja lá qual for o bichinho de sua preferência: “Em qualquer idade, ter um bicho é ter um grande companheiro. Para as crianças é especialmente importante porque ajuda a desenvolver o senso de responsabilidade (por cuidar de um outro ser), ensina a dividir carinho, espaço e atenção. Já para idosos, afastam a solidão e com isso combatem uma possível depressão.”

Apesar das inúmeras vantagens, é importante ficar atento aos excessos no chamego, que podem levar a crises de alergia e problemas respiratórios: “Há que se ter consciência de que se trata de um bicho. Podemos e devemos dar carinho, mas nada de beijar, colocar no sofá ou dormir na cama com eles. Os pais têm que ficar atentos e dar o exemplo”, alerta Flávia Janólio, diretora da Associação Brasileira de Alergia e Imunopatologia do Rio.

O problema maior, diz ela, nem é o pêlo (ou a pena), mas sim a descamação do epitélio, que aumenta a quantidade de ácaro no ambiente e favorece alergias e asma. Mas se você mantiver a higiene na casa e não permitir que o bicho transite por quartos, camas e sofás, você usufruirá só dos benefícios dessa convivência.

E, para os papais que gostam de bichos mas abrem mão de tê-los em casa para não expor os filhos a problemas, aqui vai um bom motivo para rever seus conceitos: “Pesquisas afirmam que se a criança convive com um gato ou um cachorro desde que nasce, ela tem menos chance de ter problemas respiratórios. É como se ela fosse se adaptando aos poucos e ficando com sistema imunológico fortalecido”, explicou Paulo Kussek, presidente do Departamento de Pneumopediatria da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.

BENEFÍCIOS POR FAIXA ETÁRIA

CRIANÇAS: ter um bicho desenvolve o senso de cuidado e a afetividade; faz aprender a respeitar, a ter limites e a compartilhar, dividir carinho, atenção e responsabilidade.

ADOLESCENTES: numa época em que a garotada passa por mudanças físicas e emocionais, o animal representa a aceitação total: o amigo fiel está ali, para o que der e vier.

ADULTOS: o animal leva companheirismo, alegria e descontração à casa.

IDOSOS: ter um bicho afasta a solidão; motiva idosos a se exercitarem/caminharem; faz com que se sintam úteis tendo um ser dependendo deles; ocupa a mente e, portanto, combate a depressão.

O Dia

Como as autoridades municipais e estaduais atrapalham os ciclistas de São Paulo


No mundo contemporâneo, você pode observar o grau de desenvolvimento social de uma metrópole pelo número de bicicletas em suas ruas. Amsterdã e Copenhague são duas referências extraordinárias, e o Diário gostaria que São Paulo absorvesse lições de ambas. Mas o caminho é longo, como mostra o texto abaixo, de autoria de nosso colunista-ciclista Jura Passos.

A Companhia de Engenharia de Tráfego  (CET), da Prefeitura de São Paulo, a Polícia Militar e a Polícia Rodoviária foram convidadas para dar apoio ao passeio ciclístico da Rota Marcia Prado 2012, entre São Paulo e Santos, no último domingo. A CET compareceu ao ponto de partida, na Estação Vila Olímpia da CPTM, mas nada pode fazer para evitar a aglomeração de milhares de ciclistas para acessar a ciclovia através de uma passarela de pedestres sobre a Marginal Pinheiros.

Nas duas travessias da represa Billings realizadas por balsas da EMAE – Empresa Metropolitana de Águas e Energia – a CET não apareceu para organizar o tráfego de entrada e saída de carros e bicicletas nas balsas. Resultado: congestionamento e confusão. 

Quem apareceu no lugar da CET foi a PM, de armas e cacetetes em punho, disposta a dispersar quem ousava, simplesmente, seguir seu caminho em direção ao mar, pacífica e organizadamente, sem poluir o ar, sem pressa e sem tem que pagar as abusivas taxas de pedágio cobradas nas estadas paulistas. Ao perceber isso, retirou seus soldados do “front”, abandonando uma multidão que esperou até 3 horas para uma travessia de 10 minutos.

A Rota Marcia Prado liga a ciclovia da Marginal Pinheiros à estrada de manutenção da rodovia dos Imigrantes. Foi o caminho que os primeiros ciclistas que tentavam descer de bicicleta até Santos encontraram para fazer o percurso, já que todos os caminhos do mar foram proibidos para ciclistas em São Paulo. Inclusive o Caminho do Mar, a estrada velha de Santos, fechada para o trânsito de qualquer veículo. A ciclista Marcia Prado – morta por atropelamento na Avenida Paulista – foi uma das primeiras a percorrer essa rota, que foi batizada em sua homenagem.
Marcia, a ciclista morta e homenageada

Enquanto a Polícia Militar erguia o braço contra os ciclistas, a Polícia Militar Rodoviária – acostumada a expulsar os ciclistas da Imigrantes com alguma razão, pois é perigoso mesmo – fez o inverso: isolou os acostamentos por onde circulavam os ciclistas do tráfego de automóveis, alertou os motoristas da presença deles e colocou viaturas em pontos estratégicos para orientar os condutores de duas e de quatro rodas. Se falta coordenação de informações dentro da mesma instituição policial, imagine entre as esferas de governo estadual e municipais.

Mais uma vez ficou patente a improvisação com que as ciclovias estão sendo implantadas em São Paulo. Sem planejamento sério e sem coordenação entre os governos locais e estadual e seus órgãos competentes. O acesso de ciclistas à estrada de manutenção da linha da CPTM paralela à Marginal Pinheiros – a chamada “ciclovia” da Marginal – é feito por uma passarela de pedestres improvisada. Na ponte Cidade Universitária foi feita uma abertura no muro em plena calçada, isolada da rua por muro de concreto, por onde passam ciclistas e passageiros de outra estação da mesma linha de trens. Diante da sede da CET – na Praça Ramos de Azevedo – há uma ciclovia pintada no chão, que pedestres, ciclistas e autoridades de trânsito seguem ignorando.


Essa foi a 4ª edição do passeio ciclístico da Rota Marcia Prado. O número de participantes cresceu exponencialmente ano a ano, partindo de algumas centenas até atingir alguns milhares neste ano. Organizado pelo Instituto CicloBR, que promove e defende o uso da bicicleta em SãoPaulo, o passeio se espalhou como vírus pelas redes sociais quando foram abertas as inscrições. Tão rápido que todo mundo aderiu, menos algumas das autoridades responsáveis pelos serviços públicos necessários e imprescindíveis.

Vieram grupos de ciclistas de todo o Estado e até de outros: de Presidente Prudente, Salto de Pirapora, Campinas, Limeira e do sul de Minas. Fretaram ônibus, viajaram a noite toda e na manhã seguinte estavam aglomerados na entrada da estação Vila Olímpia esperando a vez de atravessar a passarela. Prepararam suas bicicletas, estamparam suas camisetas, trouxeram suas ferramentas, alimentos, água e, sobretudo, sua saúde e disposição para enfrentar uma pedalada de 100 km, durante até 12 horas. Providenciaram quase tudo por conta própria, só não imaginaram que a maior dificuldade não seria pedalar e, sim, enfrentar o “trânsito parado”, exatamente o que os ciclistas pretendem evitar.

A Rota Marcia Prado foi criada oficialmente pela lei municipal 15.094, de 4 de janeiro de 2010. O texto da lei é autoexplicativo: ele institui a rota “cicloturística” e diz que ela “deve ser inserida no calendário oficial de eventos turísticos, esportivos e de lazer do município e contribuir para promover e divulgar o desenvolvimento turístico, cultural, ecológico, econômico, social e sustentável da região”. Ao mesmo tempo, todas as condições necessárias à sua implantação foram vetadas pelo prefeito Kassab.

Não se pode acusar a CET de desrespeitar uma lei municipal que ao mesmo tempo institui e impede a implantação da rota. Afinal, até a legislação é improvisada.

Diário do Centro do Mundo


Meritocracia acaba com a educação: professores não são operários e escolas não são fábricas!

“A política de responsabilização dos professores tem promovido uma corrosão na carreira”

Para Dalila Andrade Oliveira, o vínculo entre o resultado dos alunos e o desempenho do docente joga nas costas do professor uma responsabilidade que é do Estado e não leva em consideração outros fatores que influenciam o aprendizado.
Dalila Andrade Oliveira é presidente da ANPEd, coordenadora geral da RedEstrado e professora da UFMG
Especialista em política educacional, gestão escolar e trabalho docente na América Latina, Oliveira fala sobre as medidas governamentais que têm avançado na questão da valorização docente, como a Lei do Piso Salarial e as diretrizes nacionais de carreira, e aponta os desafios que os professores têm enfrentado atualmente – como o novo perfil do aluno brasileiro e a política de responsabilização das escolas.

Vozes – Qual são os principais desafios para a profissão docente no Brasil hoje?


Dalila - A questão da remuneração. No Brasil, os salários são muito baixos e mesmo agora, com a Lei do Piso, que consideramos uma grande vitória nessa direção, vemos a dificuldade que o país enfrenta para que os municípios e os Estados cumpram a lei. Então acho que o principal, o mais imediato dos problemas da valorização docente é a remuneração.



Vozes – Você vê semelhanças da realidade dos docentes brasileiros com os de outros países da América Latina ou do mundo?

Dalila - Com certeza, sim. Mas nós temos mais especificidades que precisam ser consideradas. O fato de sermos um país federativo e que entre os estados do Brasil há tanta desigualdade, e considerando que os docentes da educação básica pública são contratados, em sua grande maioria, pelos municípios e pelos estados brasileiros, esse é um grande problema que precisamos resolver. E essa me parece uma especificidade do Brasil que precisamos nos dar conta. Nós temos mais de 5,5 mil municípios, que contratam os seus professores e os remuneram à revelia de uma carreira nacional.

É por isso que há uma desigualdade tão grande entre os próprios professores, pelas formas de contratação e de remuneração. Eu vejo isso como um grande problema. E isso faz com que o Brasil tenha uma situação que, do meu ponto de vista, é mais urgente de ser resolvida do que a maioria dos nossos vizinhos.


Vozes – Esse problema nunca apareceu em outros países da América Latina ou eles já conseguiram resolver?

Dalila - Na realidade, a profissão docente sofre de uma crise de valorização não só no Brasil. Isso é uma tendência em muitos países do mundo e na América Latina.


Vozes – Quais deveriam ser as políticas públicas a serem colocadas em prática para enfrentar esse problema?

Dalila - Uma melhor articulação entre os governos municipais, estaduais e Federal, no sentido de assegurar as diretrizes de carreira que o Conselho Nacional de Educação já aprovou. Nós temos diretrizes nacionais de carreira desde 2009, homologadas pelo Ministério da Educação, e elas precisam se tornar práticas. Para isso nós precisamos mexer nessa articulação entre municípios, estados e governo federal.

Quer dizer, hoje nós temos uma grande concentração da arrecadação nas mãos do governo federal e justamente a responsabilidade pela fase inicial da educação (ensino fundamental e a educação infantil) é do município, que muitas vezes não apresenta condições de oferecer uma boa carreira para esses docentes. Esse é um problema muito grave.

Precisamos de políticas públicas nessa direção, que garantam uma carreira que seja mais ou menos igual no Brasil inteiro, uma isonomia de condições.


Vozes – Você acha que tem havido avanços em relação a essa valorização docente nos últimos anos?

Dalila - Apesar de serem muito poucos, acho que temos. Considero avanços a Lei do Piso e as políticas dos últimos dez anos dirigidas à formação docente dos professores em exercício nas redes públicas – que são reforços de governos estaduais e do governo federal no sentido de oferecer uma formação que seja compatível a necessidade de habilitação que o professor precisa ter para atuar naquela etapa da educação.

As próprias diretrizes de carreira também, no sentido de que já temos essas diretrizes aprovadas, mas falta serem postas em prática.


Vozes – O que significa a valorização docente?

Dalila - Para mim, a valorização docente é um conceito muito preciso. Ele foi cunhado no Brasil nos anos 60, durante o processo constituinte, e é assentado em três pilares: 1) a remuneração digna para os docentes; 2) condições de trabalho, incluindo aí carreira. É importante que o docente tenha bons vínculos empregatícios, ou seja, com ingresso na carreira (mediante concurso público), que ele tenha estabilidade no emprego e que esse trabalho tenha boas condições. Ele precisa de boas condições de trabalho para poder desempenhar bem o seu trabalho.

E o terceiro eixo é a formação. Nós entendemos que – e quando eu falo “nós”, eu represento a ANPEd – a formação mínima para o professor atuar em educação básica deve ser uma formação de nível superior. E além da formação inicial, a formação continuada, entendida como formação ao longo da vida. Quer dizer, do nosso ponto de vista, inclui, inclusive, a pós-graduação, a oferta de mestrados dirigidos mesmo à melhoria da sua prática.


Vozes – Você acha que, no caso da questão da formação, há problemas? As políticas públicas têm caminhado bem em relação a esse pilar?

Dalila - Nós avançamos um pouco na formação se você considerar que, em 1996, o ano em que foi aprovada a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) atual, apenas um terço dos professores em exercício no Brasil na educação básica em redes públicas tinha habilitação específica e que hoje exatamente o contrário (dois terços) tem formação em nível superior, com habilitação específica, e apenas um terço não tem.

Então, nós devemos considerar que nesses menos de 15 anos nós tivemos um avanço considerável. Mas é claro que temos muitos desafios no que se refere à formação. É necessário não só formar os professores que estão em exercício, como formar os novos professores, adequar essa formação à prática hoje realizada nas escolas. Essa formação docente tem que estar mais voltada, por exemplo, à ampliação do direito à educação, que trouxe para nós, nas últimas duas décadas, um novo perfil de aluno.

Se a gente considerar que em 2009, com a emenda constitucional no 59, alargamos a obrigatoriedade de quatro para 17 anos, é urgente hoje pensarmos a formação desse docente que vai atuar na educação infantil. Há muita improvisação na educação infantil.


Vozes – Qual seria esse novo perfil de aluno com quem o professor está lidando?

Dalila - Nas últimas décadas nós tivemos a entrada do segmento mais pobre da população na escola e de segmentos que antes não frequentavam a escola. A educação avançou muito no campo, nas populações ribeirinhas, em segmentos étnico-raciais. Então hoje nós temos um aluno com uma situação mais diversa dentro da escola e é importante que a instituição saiba responder a esse aluno. Para isso a formação do professor é tão importante.

Nos últimos anos nós passamos a ter também uma educação inclusiva, no aspecto dos alunos portadores de necessidades especiais. É muito importante que a formação dos professores esteja também orientada nessa direção.


Vozes – Qual é o perfil do professor brasileiro hoje?

Dalila - O perfil do professor brasileiro hoje é muito variado, mas se a gente for falar em termos estatísticos nós temos cerca de 80% mulheres, que têm em torno de 38 e 42 anos, que ganham até três salários mínimos, com formação em nível superior e em geral casadas e com filhos, dada a idade que elas apresentam.

Nós estamos tendo também cada vez mais entrada no magistério público de professores oriundos de camada social mais pobre, portanto é muito importante investir na possibilidade de acesso que ele tem a bens culturais. Por isso uma remuneração boa é fundamental para que esse professor possa ir ao cinema, ter uma televisão a cabo, comprar bons livros etc.

Como a profissão não oferece boas condições, uma remuneração compatível, boas condições de trabalho e carreira, acaba que a preferência pela licenciatura, a educação como profissão na vida não tem sido muito buscada, muito encontrada.


Vozes – Como você vê o atual processo de responsabilização docente?

Dalila - As escolas, em geral, são orientadas a responsabilizar o professor para que ele busque o seu desenvolvimento profissional por ele mesmo. Então ele que tem que buscar sua formação inicial, apesar de todas as dificuldades, buscar fazer um curso ali, às vezes por sua própria conta, para poder ter alguns pontinhos a mais na carreira, ganhar um pouco mais ou ser promovido.

Se formos pensar no aspecto mais amplo da gestão da escola, o que essa política hoje de responsabilização dos professores tem feito é promover uma verdadeira corrosão na carreira.

Hoje, nós temos visto cada vez mais gestões municipais e estaduais no Brasil vincularem o desempenho do aluno à remuneração do professor. Como se o professor só fosse produtivo se o seu aluno for bem na escola e nos testes. Então é responsabilidade dele que o aluno vá bem. E aí ele recebe uma bonificação, uma premiação, seja lá o que for.

Mas o que acontece é que nós sabemos que o desempenho dos nossos alunos não dependem somente do trabalho do professor. Depende da origem social dele, do acesso que ele tem a bens culturais, do apoio que ele tem em casa, de como que ele se entrosa na sala de aula, de quanto aquele currículo é adequado ou não ao seu aprendizado. E no final, tudo isso é obscurecido, é renegado, e a única coisa que conta, nessas políticas, é o trabalho do professor.

Realmente é uma pena isso que a gente tem visto acontecer, não só no Brasil – essa tem sido uma tendência em vários países do mundo, inclusive na Europa e na América Latina -, e que vem de fato correndo a carreira docente.


Vozes – Como deveria ser a gestão escolar ou a atuação do governo em relação a essa questão da responsabilização docente?

Dalila - Eu acho que a política de responsabilização joga nas costas do professor aquilo que é de responsabilidade do Estado e da sociedade. No caso do Brasil, a gente precisa ter um sistema nacional mais orgânico, pra que isso fique mais claro – inclusive para que essa relação primeira que a gente falava na primeira questão que você fez, entre os municípios, estados e governo federal, seja melhor equilibrada.

Além disso, o que precisamos, na realidade, não é responsabilizar o professor pelo fracasso ou pelo sucesso dos alunos dessa maneira que vincula diretamente os resultados dos testes padronizados com a produtividade docente.

O que precisamos é de boa carreira, uma boa remuneração, boas condições de trabalho, uma escola que ofereça dedicação exclusiva ao professor, para que ele possa ter maiores vínculos com a instituição e com os seus alunos. Tenho certeza que isso faria muito mais bem para a educação brasileira do que esse jogo de culpabilidade que essa política de responsabilização cria.


Vozes – Quais os principais avanços dos últimos anos na questão da profissionalização docente? 

Dalila - Não sei se tivemos avanços quanto à profissionalização, não. A não ser as diretrizes de carreira das quais já falei, e o piso nacional, que dá uma ideia de profissão (quer dizer, ninguém que é contratado como tal pode ganhar menos do que isso), acho que nós estamos vivendo na realidade um ataque à profissionalização docente com essa política de responsabilização.



Educação a distância? Sim, claro, mas para os filhos dos outros!


EAD é uma excelente coisa. Alguns, como eu, falam de tal prática com conhecimento de causa, outros, que nunca a usaram para valer, grasnam aqui e ali.

Quando você começar a defender o ensino a distância para graduações plenas, no Brasil atual, pare e se pergunte sinceramente: eu daria isso ao meu filho ou gostaria que ele fizesse um curso regular, presencial?

Os que têm alguma vida intelectual, que são professores universitários ou ocupam cargos que demandaram formação intelectual mais sofisticada, caso sejam honestos consigo mesmos, jamais darão a resposta, em público, optando pelo ensino não presencial. Os educados entre os anos 40 e 60 fizeram escola pública. Alguns mais ricos fizeram os colégios particulares de alta elite (e não os que se passam por tal, mas são de classe média – os apostilados). No meu caso, toda a minha trajetória principal é em escola pública. O ministro da Educação atual(em 2009), Fernando Haddad, mais novo que eu, usou a escola particular, nunca pisou na escola pública, ao menos não antes de ser ministro. Ele sempre foi rico. Eu não deixaria meus filhos não prestar vestibular para a universidade estatal. Caso fossem para a uma particular, por alguma razão, empurraria para uma PUC ou Mackenzie.

Nossas elites fazem o ensino a distância, atualmente, ser exatamente aquilo que foi o ensino profissional. Há a “escola para os nossos filhos” e a “nossa escola para os filhos dos outros” – esta é a verdadeira política educacional de nossas elites. Adorávamos falar bem do ensino profissionalizante, técnico, mas, para os nossos filhos, queríamos o ensino propedêutico – o caminho para a universidade. 

Mutatis mutandis, aplicamos hoje a mesma coisa ao ensino a distância, pois falamos bem do ensino a distância quando estamos em público, mas não a quatro paredes, não para os nossos filhos. Não queremos que o Gilberto Dimenstein, o garoto propaganda do PSDB (e talvez até do PT, agora que o PT mensaleiro se igualou ao PSDB “social democrata”), tenha xiliques conosco. Todavia, uma vez em casa, aconselhamos um filho nosso a fazer a universidade presencial, de preferência estatal.

Quando pressionados, dizemos assim, hipocritamente: “ah, mas o ensino a distância também é bom, e conhecemos lugares onde o presencial é ruim, e o ensino a distância é para democratizar a universidade – nem todos podem ir para onde existe universidade”. 

Na condição de pessoas da elite, deveríamos dizer outra coisa, caso fôssemos honestos mesmo: “vamos melhorar o ensino básico, vamos ampliar as vagas das universidades estatais, vamos pagar bons salários para todo professor no ensino estatal em todos os níveis etc”. Já fizemos algo assim no passado. Podemos fazer de novo. Não temos que voltar ao que foi moda nos Estados Unidos nos anos 70, a “pedagogia compensatória”. Não foi ela que melhorou o nível intelectual do americano. Aliás, os que propunham isso nos Estados Unidos, diziam propor para eles mesmos, mas, na verdade, queriam só que os latinos usassem aquilo, dentro do país, e também vendiam aquilo como solução para a educação no Terceiro Mundo.

Deveríamos usar o EAD como apoio, um grande apoio por sinal. Deveríamos usar o EAD como canal para alguns tipos de ensino técnico. Deveríamos usar o EAD para programas de treinamento. Mas não podemos usar o EAD para a graduação, para a formação básica do profissional, especialmente em relação aos saberes que demandam vivência universitária. O último curso que eu colocaria em EAD é o curso de pedagogia ou qualquer outra licenciatura. Não falo isso como algo que tenha valor em lugar e em todos os tempos. Falo isso para o Brasil atual. Temos condições de fazer coisa melhor do que tentar preservar uma parte da universidade estatal para nossos filhos, e oferece-la em moldes de EAD para os filhos dos outros. Seria mais digno e muito possível oferecermos aos outros o que damos de melhor aos nossos. E isso, nós sabemos bem, é possivel. Caso quiséssemos, faríamos um programa de diminuição da distância social e econômica entre nós, e ampliaríamos para valer a boa universidade e também a chance de um bom número de pessoas gastarem 4 anos para ter vivência universitária – isso é fundamental.

O que desejamos para nossos filhos é o que deveríamos desejar para os filhos dos outros. O resto é demagogia, hipocrisia e conversa fiada, e isso quando não é coisa pior, bem pior. EAD é boa coisa, mas não deveria servir como está servindo, para não fazermos, antes, o que deveria ser feito em termos de uma política educacional de gente séria.

Paulo Ghiraldelli Jr., filósofo  24/06/2009

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Faculdades particulares: “Dê aula e se limite a isso”

Apesar da redução de salários e da carga horária, algumas universidades particulares têm aumentado o fluxo de trabalho de seus docentes com a adoção do ensino semipresencial em suas grades curriculares. Isto porque, conforme especialistas ouvidos pelo jornal Brasil de Fato, esse tipo de método educacional tem uma dinâmica diferente, requerendo mais tempo dos professores para a elaboração das atividades e correção de trabalhos.


O ensino à distância nas universidades particulares é regulamentada pelo Ministério da Educação (MEC). De acordo com a Portaria 4.059, de 10 DE dezembro de 2004, as instituições podem ofertar disciplinas semipresenciais em seus currículos, desde que não seja ultrapassado o limite de 20% da carga horária total do curso.

Contudo, a adoção do ensino semipresencial por essas universidades significa apenas a possibilidade de abater o “custo-benefício por cabeça”. É isso que pensa o secretário do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes), Rondon de Castro. Ao regulamentar tal método, para Castro, o governo mostra que sua real intenção “está longe da qualidade do ensino, e sim de obter um número para computação em seus relatórios”.

Segundo o vice-presidente do Sindicato dos Professores de Instituições Particulares de Ensino Superior de Curitiba e Região Metropolitana (Sinpes), Valdyr Arnaldo Lessnau Perrini, o ensino semipresencial é um “verdadeiro câncer” que tem se espalhado no ensino superior. Ele afirma que o método é válido para regiões longínquas, onde há dificuldades de locomoção dos estudantes até as instituições. “Mas esses cursos à distância estão se espalhando na graduação e os cursos que são presenciais começam a ter um percentual significativo de aulas à distância, isso para liberar a sala de aula e botar mais alunos”, explica o sindicalista.

Professores têm que lecionar conforme manuais pré-estabelecidos pelas universidades e são sobrecarregados com um número maior de alunos devido à adoção do ensino semipresencial .


Como consequência, os professores passam a ter mais alunos sob sua responsabilidade com as turmas semipresenciais. “Ele não vai ter aquele limite físico de 60, 70, 80 pessoas por aula. O mesmo professor vai ter 200, 300 alunos à distância. Vai ter mais provas para corrigir e mais dificuldades, porque é toda uma filosofia nova de ensino”, pondera Perrini.
Menos participação

Segundo Castro, a adoção do ensino à distância nas universidades particulares faz parte do processo de tecnização do ensino superior. Ele avalia de forma negativa a condução do ensino superior para o caráter técnico, porque visa apenas a formação de mão de obra. Segundo o diretor do Andes, a prática resulta na precarização do trabalho docente, já que impõe manuais aos professores, afastando-os da pesquisa e da extensão.

“Antes você discutia propostas para os cursos, linhas de atuação, dava sugestões e havia um bom espaço para isso. Atualmente, o professor é contratado e tem de se encaixar num modelo pronto, deve lecionar diversas disciplinas distintas e recebe um plano de aula fechado, com poucas possibilidades de criação”, relata o professor Dorival Reis (nome fictício). De acordo com o docente, que leciona há 27 anos, o nível de participação dos professores nas universidades particulares caiu bastante nos últimos anos.

Somando-se às críticas, Walcyr de Oliveira Barros, vice-presidente da Regional do Rio de Janeiro do Andes, explica que os professores têm que se submeter às regras impostas pelas universidades, porque não têm a estabilidade no emprego que lhes garantiria segurança para se contrapor. “Para esse sistema privado, a lógica imposta para o docente é que ele dê aula, aula de conteúdo técnico e se limite especificamente a isso”, resume.

Brasil de Fato